segunda-feira, 12 de março de 2007



Noturnos

Mais uma noite furtada dos sonhos. Um momento de fresco silêncio banhado apenas ao que se quer. Melodias ou vinho, ou ambos. Talvez haja uma receita de paz eterna pros seres noturnos. Fadados a transmutar em noite os seus dias. Escapar de todo o mundo preferindo uma estranha alegria, a introspecção. Voltar o mundo pra si mesmos e aos cúmplices soturnos da noite adentro. Conjeturar explicações para a não aceitação do dia que por fato, não que seja um fardo, surgirá. Os noturnos compreendem e captam o essencial da criação, o oco pré-vindouro. O dia é muita vida demais com um sol só. A noite é o torpor no qual respiram os moribundos, os boêmios, os sacanas, os noturnos. É o sangue dos vampiros de mentes, que querem sugar tudo o que os cérebros são capazes de doar em manifestação expelida de concordância; o fluido dos impulsionadores de almas, que querem sentir auras de amor e exaustão, êxtase do cansaço da tentativa de desvairar. Não são malignos ou benfeitores os noturnos. Não são vistos, apenas existem. Assim não podem ser julgados; defeitos em perfeitos e invisíveis aos seus olhos. A noite é uma criança que brinca e não se cansa. Com brinquedos e brincadeiras a noite é o acalanto do amanhecer, a lua o ninar do sol, os noturnos os vadios a bailar. Criadores de estórias, inspiradores de sonhos, ciganos alados com espectros de cavalos medonhos. Chame-os como quiser, não os verá. Pode senti-los, imaginá-los ou... sê-los. Querê-los? Ilusão. Amá-los? Crença e fé, divagação. Pela noite todos os gatos são pardos. Os noturnos nada mais são que os gatos pardos da noite que barulham os telhados ou berram no combate pelo cio. Fazem bagunça pela madrugada, rasgam a noite em claro feito o lampião. Gritando pela rua afora, propagando devaneios, roubando silêncios alheios, renunciando ao sonho iminente de tentar solenemente ser apenas um poltrão... surgem os noturnos, acreditem vocês ou não!

22 de julho de 2005

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