segunda-feira, 12 de março de 2007

Meu velho tapete

Deu uma rachadura fininha no meu velho tapete fino. Desfiou um sonho puxado lá do meio agarrado no espinho de uma flor. Meu tapete nunca novo, meu tapete não muito velho, meu tapete aconchegante que me sinto como em casa. Do tapete eu sou um velho cão que deita rabugento por saber nele o seu todo e sempre velho cheiro. Levo a vida em um tapete procurando pulgas alfinetadas.

Até tem certa poeira cotidiana nele, um incômodo sujinho que nem quase incomoda mais. É um pó que, quando batido, alergicamente espirra os narizes alérgicos da poeira jogada, varrida para debaixo dos tapetes do mundo. O dia-a-dia se escondeu para baixo destes assentos do ar no chão para que, sorrateiro, passasse sem ser percebido pelos cidadãos honoráveis. Como cão sem ladrar, eu aceito o passar das horas e me aninho junto ao ar quase à beira deste chão rabugento. Confortavelmente passam por mim e por meus pêlos todas as horas de quase todas as semanas infindavelmente até galgar os meses recolhido sobre todo o passar da existência canina diária.

Um cão velho e um antigo tapete. Relação afetuosa entre pêlos, linhas e cheiros caseiros. Minha sala de estar, quando não meu quarto predileto, minha quente lareira. Tudo do tapete me é casa. Onde me recolho para espiar o mundo que transcende os olhos e minha visão bicolor. O tapete é minha almofada para chorar minhas dores. Tudo no meu mundo é o mundo vivido numa vida de cachorro deitado em meu velho tapete.

18, 03, 2005

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